Biológicos sem mitos na dermatologia: tudo que os pacientes precisam saber sobre medicamentos biológicos usados no tratamento das doenças dermatológicas

Evento online abordou tudo que os pacientes precisam saber os medicamentos biológicos e biossimilares usados no tratamento das doenças dermatológicas, em especial a psoríase e a hidradenite supurativa 

Organizado pela Biored Brasil com apoio da iniciativa privada, o evento online Biológicos Sem Mitos na Dermatologia reuniu especialistas e associações de pacientes para debater os avanços nos tratamentos de doenças dermatológicas com o uso de medicamentos biológicos e biossimilares. O evento faz parte da programação do Webinário Cenário das Políticas Públicas de Acesso a Medicamento Biológico e Biossimilar.

Participaram do webinar os médicos Dr. Wagner Galvão, dermatologista e Dr. Ricardo Garcia, pesquisador da Clapbio, além de representantes das associações Psoríase Brasil, Psorierj, Grupo EncontrAR e Grupar-RP. O evento pode ser assistido na íntegra no canal do YouTube da Biored Brasil: https://www.youtube.com/watch?v=r9PA6FK2tUc&feature=youtu.be 

Com a palestra “Medicamentos biotecnológicos usados no tratamento das Doenças Dermatológicas”, o dermatologista Dr. Wagner Galvão contou como o advento dos medicamentos biológicos revolucionou as expectativas no tratamento dos pacientes. O especialista iniciou sua participação explicando o que são os medicamentos biológicos. “Basicamente, o biológico é feito a partir de uma célula viva, diferentemente de um composto químico. Por isso, as medicações biológicas são mais complexas”, conta. Mas como surgiram os medicamentos biológicos?

O dermatologista contou que foi a partir de um especialista argentino que descobriu a possibilidade de pegar uma célula do mieloma múltiplo, um tumor capaz de produzir anticorpos e reprogramá-los para atacar um alvo específico. “Ele descobriu como montar uma “fábrica de anticorpo” contra alvos específicos. E os medicamentos imunobiológicos são medicações que direcionam contra um alvo específico. Isso abriu um leque, um campo, gigantesco, fazendo uma verdadeira revolução nessa área de doenças imunomediadas”, explicou.

Atualmente, na dermatologia, os medicamentos biológicos são utilizados no tratamento de diversas doenças, tais como: psoríase, hidradenite, melanoma nas imunoterapias, os linfomas, o tumor de Merkel, dermatite atópica, a alopecia areata, urticária crônica, pênfigo e lúpus. Sendo a psoríase a doença com maior possibilidade de tratamento dentro deste segmento até então, segundo o especialista. 

O médico também apresentou um artigo a respeito do impacto do uso de biológicos na psoríase ao longo de 10 anos. Nesta publicação constam dados desde a fase de aprovação dos primeiros medicamentos biológicos. O médico destacou a velocidade da evolução desse tipo de tratamento, pois em apenas uma década dois medicamentos que constavam no artigo já não estão mais no mercado devido às novas descobertas.  E o impacto dessa evolução na psoríase foi expressiva. 

“Quando havia poucas ferramentas, estabelecíamos como meta mínima melhorar 50% as lesões. E isso foi aumentando com a inclusão de medicamentos mais eficazes. Atualmente, em consenso com a Sociedade Brasileira de Dermatologia, a gente tem como meta melhorar pelo menos 75% das lesões de psoríase. Mas com as inclusões de novos medicamentos mais eficazes, na maioria dos consensos internacionais, a gente já vê uma melhora de pelo menos 90% das lesões. Não é 100%, mas em geral já se relaciona a um aumento muito significativo na qualidade de vida”, garantiu o profissional. 

Ele reforçou ainda que observando a ciência é possível ver o impacto dessas novas tecnologias e identificar o aumento significativo de artigos publicados entre 1990 a 2016 sobre a psoríase a partir da incorporação dos medicamentos biológicos. Isso mostra o impacto positivo desses medicamentos na prática clínica e no desfecho dos pacientes. 

A escolha do medicamento ideal para cada paciente

Existem diversos medicamentos biológicos disponíveis e a escolha da melhor opção para cada paciente leva em consideração diversos fatores. O médico explica que cada doença se comporta de uma forma no organismo do indivíduo e os medicamentos também possuem mecanismos de atuação diferentes. Tudo isso faz parte da decisão do médico na hora da prescrição, sem deixar de avaliar a eficácia, segurança e o acesso do paciente ao medicamento. 

O acesso é, segundo o médico, a etapa mais delicada dessa avaliação. No caso da psoríase, por exemplo, até pouco tempo atrás não havia a regulamentação e a inclusão dos biológicos tanto no SUS quanto no mercado privado (planos de saúde). E a única forma do paciente conseguir o acesso ao medicamento era através da artrite psoriática (um desenvolvimento da doença que já possuía regulamentação), pois caso contrário o SUS não arcava com o medicamento. Atualmente, no SUS já existem medicamentos biológicos regulamentados para a psoríase, por meio dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) publicado em 2018, porém no sistema privado ainda não há. 

Com isso o paciente pode retirar pelo SUS os medicamentos: o adalimumabe, indicado na primeira etapa do tratamento após falha da terapia padrão para psoríase; o secuquinumabe e o ustequinumabe, indicados na segunda etapa do tratamento após falha da primeira etapa e o etanercepte, indicado na primeira etapa de tratamento da psoríase após falha da terapia padrão em pacientes pediátricos.

E além da psoríase, na área da dermatologia, hoje no SUS existe regulamentação de medicamentos biológicos para tratamento de dermatite atópica, lúpus e pênfigo. Para esta última doença inclusive existe uma determinação de aprovação rápida em todo mundo, ou seja, uma determinação para que o processo de aprovação de medicamentos seja encurtado já que se o pênfigo for tratado precocemente há altas chances de cura. O Dr. Wagner também afirmou que existem pesquisas avançadas para novas opções do tratamento de lúpus com medicamentos biológicos. 

O dermatologista explicou que diversos medicamentos biológicos estão sendo aplicados em outras doenças, mesmo que a bula não seja direcionada para essa enfermidade, pois há melhora em diversos casos e os estudos apontam a possibilidade de uso. Para exemplificar ele contou que os primeiros estudos com o anticorpo anti-TNF foram feitos para enfermidades que não têm relação nenhuma com os usos atuais dele. Porém, um paciente dos testes tinha Doença de Crohn e também hidradenite supurativa e melhorou com o uso do anti-TNF. A partir disso, abriu-se uma chave para opções de tratamento para essa doença, com novas possibilidades de uso dos medicamentos. 

Custos dos medicamentos atrapalham acesso e abrem discussão sobre intercambialidade

O Dr. Wagner apresentou dados que afirmam que os medicamentos biológicos são cerca de 3% das prescrições no Brasil, mas são 40% do orçamento do Ministério da Saúde e o Mercado Estimado para 2020 é de U$ 287 bilhões (em nível global). E, segundo o médico, para a aquisição e distribuição desses medicamentos biológicos existem diversos interesses envolvidos por se tratarem de remédios caros. “Tem o paciente que precisa, tem a sociedade que paga, tanto no público quanto no privado, além da indústria que quer otimizar o lucro”, afirmou ele. 

Uma opção para tentar minimizar parte das dificuldades de implementar os biológicos é o uso dos medicamentos biossimilares. Os biossimilares são medicamentos produzidos através de processos de engenharia e são uma ‘cópia’ do medicamento biológico originador. Para serem utilizados esses medicamentos precisam cumprir várias etapas e comprovar eficácia semelhante ao produto original. Eles têm potencial de baratear o acesso e diminuir o impacto econômico. Porém o uso desses medicamentos gera uma grande discussão sobre a eficácia, a segurança e a possibilidade de troca entre eles, conhecida como intercambialidade.

Para explicar melhor o tema e a discussão provocada por ele, Dr. Ricardo Garcia, pesquisador da Capbio, apresentou a aula “Definição de Intercambialidade entre medicamento biológico originador e biossimilar (ou vice e versa)”. Para o médico a palavra intercambialidade é a mais debatida no mundo dos medicamentos biológicos atualmente e gera ainda muita dúvida entre os pacientes. Os medicamentos biológicos são um marco na terapia médica e os biossimilares são um marco na terapia biológica. Mas por que discutir a intercambialidade? Por que discutir se troca ou não troca o medicamento? Se uma molécula biológica é intercambiável ou não? Isso tudo por um único motivo: a questão da similaridade.

“Similar não é idêntico. O biológico e o biossimilar são duas drogas complexas, com qualidade, eficácia e segurança, mas que molecularmente não são idênticas: são altamente similares. Isso é um problema? Sim ou não. Não é necessariamente um problema para uma terapia, mas pode vir a ser um problema na intercambialidade, na troca”, explicou ele. 

Segundo Dr. Ricardo a grande preocupação está na possibilidade de haver reações diferentes no organismo já que as moléculas não são idênticas e há poucos estudos sobre intercambialidade. Ele reforça que as evidências científicas ainda estão surgindo aos poucos e por ainda não existir 100% de certeza se haverá reações adversas, o debate continua em relação a troca entre medicamentos biológicos e biossimilares, especialmente sem aviso prévio e de forma irregular. 

Essa falta de aviso prévio na troca entre medicamentos foi algo que José Célio Peixoto, representante da Psoríase Brasil, já viveu na pele. “Eu uso o etanercepte já há 6 anos. Há uns 8 meses eu recebi esse aqui  Brenzys (mostrou no vídeo) e notei que era diferente. Aí eu liguei para o meu médico e ele não sabia que tinham mudado. Eu perguntei se podia usar e ele disse que sim. Eles trocaram o medicamento, mas é a mesma embalagem e quem recebe dificilmente nota a diferença. É um biossimilar que não foi previamente comunicado nem ao médico”, contou. José Célio ainda reforçou em sua participação a importância de lutar por um controle dessas mudanças dos medicamentos. 

Ana Lúcia Paduello, representante do Grupar-RP, fez coro à declaração de José Célio. “Enquanto associação de pacientes nossa maior preocupação sempre foi a questão das múltiplas trocas. A gente sabia e já vem debatendo isso há anos que esse momento ia chegar. E esperava que o nosso governo estivesse preparado para a chegada dos biossimilares da mesma molécula e que já tivesse aí um regulamento de como se daria o uso e a distribuição dos medicamento. Infelizmente isso não aconteceu até agora”, lamentou. 

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