Especialistas defendem a necessidade urgente de resolver gargalos e de acolher e engajar a população em torno da vacinação para reconquistar a confiança nas doses que nos protegem
No dia 09 de junho foi comemorado o Dia Mundial da Imunização, data na qual o mundo reflete sobre o assunto, que é uma das pautas mais importantes em saúde. Tanto que a Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou a Agenda de Imunização 2030, com o propósito de alavancar as taxas de vacinação, com meta de salvar mais de 50 milhões de vidas globalmente no período. A ideia é elaborar e pôr em prática campanhas capazes de recuperar o protagonismo das vacinas, abalado especialmente durante a pandemia de covid.
No Brasil não foi diferente. Conhecido como referência em programas de vacinação, depois do melhor ano, 2015, quando o País alcançou mais de 95% da cobertura vacinal, começou a amargar quedas significativas no número de pessoas vacinadas. E isso em todos os grupos etários, de bebês a idosos.
A força dos bons exemplos
Mas temos um histórico poderoso a nosso favor. E para vencer as barreiras, acredita Marco Aurélio Sáfadi, infectologista pediátrico, é preciso destacar as conquistas. “Veja o caso da coqueluche, cuja incidência diminuiu dramaticamente com a estratégia de vacinar as gestantes, num programa implementado há uma década e que mostrou eficácia na redução das mortes de bebês”, exemplifica.
“Ninguém consegue negar que, graças à vacina, a varíola foi erradicada, o sarampo foi eliminado de diversas regiões do planeta, as meningites hoje têm taxas dezenas de vezes menores.” Sáfadi destaca ainda que a vacinação em massa é especialmente importante em países de baixa e média renda, onde a mortalidade por algumas doenças infecciosas, como a diarreia por rotavírus, é bem mais elevada que nos de alta renda. “Vacina é um instrumento de saúde pública. Ela iguala as pessoas e as oportunidades.”
Trabalhar para derrubar equívocos
Para a pediatra Mônica Levi, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a disseminação das notícias falsas, as fake news, é um dos principais problemas a ser revolvidos. E aproveita para esclarecer sobre o medo de reação que leva as pessoas a desistirem de se proteger: “Vacinas como a da gripe podem dar uma dor no local da aplicação, até uma febre, uma moleza no corpo, mas são reações autolimitadas, benignas”. A médica conta que no dia a dia do consultório vê bastante confusão com pacientes alegando não tomar a dose anual contra influenza (vacina da gripe) por medo de ela provocar a doença. “É impossível, uma vez que é feito com vírus influenza inativado, fracionado.”
Com as quedas da cobertura vacinal, não apenas as crianças e adolescentes estão desprotegidos, avisa a pediatra Isabella Ballalai, diretora da SBIm. “Para os idosos, infelizmente, a comunicação do calendário público é muito pobre”, avalia. “Não existem ações para lembrar que a vacina da hepatite B está disponível, que é preciso revacinar contra tétano. A exceção é a campanha da gripe, que mesmo assim não gera engajamento. A comunicação precisa ser feita o tempo todo, divulgando calendário e recomendando inclusive as vacinas pagas, como a da herpes-zóster, tão importante para esse público.”
É preciso facilitar o acesso
Na visão de Isabella Ballalai, as dificuldades cotidianas são um componente nessa equação. “Os postos de saúde funcionam em horário comercial, com interrupção na hora do almoço. Imagina o número de mulheres que trabalham e que se faltarem para levar o filho para se vacinar não são abonadas.”
Para Mônica Levi, o acolhimento é ponto fundamental para virar o jogo. “Existem situações em que o profissional de saúde se recusa a aplicar a dose no fim do expediente porque teria que abrir um novo frasco do produto. Aí, quem fez o esforço para chegar a tempo pode não voltar mais.”
Repensar o horário de atendimento, capacitar os profissionais na linha de frente e respeitar as diferentes necessidades pelo País afora são ações urgentes na retomada. Nesse sentido, Isabella Ballalai destaca os bons resultados do projeto Pela Reconquista das Altas Coberturas Vacinais (PRCV), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Ministério da Saúde e a SBIm. “Ele começou no Amapá e na Paraíba, dois Estados que apresentavam as menores taxas de imunização. Já na campanha da pólio de 2022, a Paraíba foi o primeiro a atingir 95% do público-alvo”, comemora.
Fonte: NK Consultores/Estadão.