Em um laboratório na cidade de São Paulo, cientistas comemoram o desenvolvimento de uma nova molécula promissora para o tratamento do câncer. A milhares de quilômetros dali, em um pequeno município do interior, um paciente aguarda ansiosamente por uma terapia inovadora, capaz de salvar sua vida. Entre esses dois pontos, estende-se um labirinto burocrático que exemplifica o desafio do Brasil em equilibrar inovação farmacêutica e acesso equitativo aos tratamentos de ponta.
Dono da nona maior economia do mundo, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI)¹, o País tem enfrentado um paradoxo na área da saúde: se, por um lado, possui uma robusta indústria farmacêutica e um sistema de saúde universal, por outro, frequentemente os pacientes precisam lidar com longas esperas para ter acesso a terapias inovadoras – muitas vezes ficando para trás quando comparado aos seus vizinhos latino-americanos.
São diversas as etapas até que um medicamento possa chegar, de fato, às pessoas. Primeiro, é necessário um processo de registro do produto junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); depois, aplica-se uma metodologia de precificação, até que, por fim, a tecnologia seja devidamente incorporada ao sistema de saúde. “O principal obstáculo do Brasil encontra-se, justamente, na fase de incorporação, que de fato define quais medicamentos vão estar à disposição da população”, explica Renato Porto, presidente-executivo da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma).
O custo da demora
“Quanto mais tempo a gente demora a sanar um problema, menos o Produto Interno Bruto (PIB) do País progride. Fazer com que as pessoas tenham um bem-estar adequado não é custo, mas investimento, e vários países já provaram isso”, ressalta Renato Porto. A indústria farmacêutica se encontra no centro desse debate, equilibrando-se entre a necessidade de retorno sobre investimentos bilionários em pesquisa e desenvolvimento e a responsabilidade social de tornar os tratamentos acessíveis.
“Desenvolver é caro; nós estamos falando de 10 mil moléculas que são pesquisadas até uma se tornar viável comercialmente”, avalia o presidente-executivo da Interfarma. A título de comparação, ele explica que a indústria farmacêutica investe 30% do seu faturamento em pesquisa e desenvolvimento, enquanto a indústria da aviação civil investe 14%. “Isso mostra o grau de risco que é tentar produzir e desenvolver um medicamento”, completa.
A solução para esse impasse complexo requer uma abordagem multifacetada. Especialistas apontam para a necessidade de maior transparência no processo de incorporação de novas terapias, aprimoramento da governança do sistema de saúde e uma colaboração mais estreita entre o setor público e o privado.
O desafio do Brasil é claro: acelerar o acesso à inovação médica sem comprometer a sustentabilidade financeira do sistema de saúde. O sucesso nessa empreitada não apenas salvará vidas, mas também posicionará o País na vanguarda da revolução biotecnológica global. O tempo, como sempre na medicina, é essencial.
Referências:
Fonte: Estadão