Um banco de dados com informações mais claras e acessíveis sobre o câncer de mama no Brasil será lançado em novembro com o objetivo de diagnosticar a situação atual da jornada e padrão de tratamento dos pacientes tratados com a doença no SUS (Sistema Único de Saúde).
Na nova plataforma, chamada Prisma, pessoas interessadas em buscar dados sobre o tumor mamário no Brasil poderão, por exemplo, saber quanto tempo uma paciente demora para ser operada ou para iniciar a radioterapia e quimioterapia, e até mesmo se ela já deu entrada no SUS com um câncer avançado ou se a doença progrediu enquanto esperava tratamento.
“A plataforma permitirá identificar áreas de melhoria, destacar ilhas de excelência e replicar boas práticas, além de orientar onde é preciso investir mais dinheiro”, afirma a oncologista Laura Tesla, que participou do desenvolvimento do projeto.
O Inca (Instituto Nacional de Câncer) estima que a incidência do câncer de mama no Brasil será de cerca de 74 mil novos casos por ano entre 2023 e 2025. É o tumor mais comum entre as mulheres, atrás apenas do câncer de pele não melanoma.
O Ministério da Saúde já disponibiliza muitos dados sobre o câncer de mama, mas, segundo Tesla, a dificuldade está na organização e acesso às informações, que estão dispersas em diversos sistemas, tabelas e gráficos.
O banco de dados a ser lançado no final de novembro vai unir essas informações com uma linha do tempo do cuidado ao paciente, ou seja, vai ser possível acompanhar uma pessoa desde o diagnóstico até o final do tratamento, o que não é possível hoje pelo DataSUS (Departamento de Informática do Ministério da Saúde).
O sistema de dados do governo federal coleta, processa e dissemina informações sobre a saúde do Brasil. No DataSUS, é possível verificar o total de óbitos e diagnósticos de câncer de mama, mas não se sabe se a pessoa diagnosticada em 2016 é a mesma que fez uma cirurgia em 2017, ou se essa pessoa morreu, por exemplo.
Participaram do desenvolvimento da plataforma especialistas em saúde, tecnologia e academia. Oncologista e ex-ministro da Saúde, Nelson Teich foi um dos desenvolvedores. Segundo ele, com o acompanhamento de cada paciente, vai ser possível identificar o que acontece durante todas as fases de tratamento e onde há erros a serem corrigidos.
“Hoje, um dos grandes problemas no sistema de saúde é que não temos uma informação mais completa. Como a saúde vai se tornando complexa, vai se tornando mais necessária a criação de estruturas de informação mais complexas para entender o cenário”, diz.
Teich afirma ainda que é preciso melhorar a integração e manter igual a qualidade dos serviços municipais, estaduais e federais relacionados à saúde. “Não adianta ter um super programa de diagnóstico em relação à atenção primária, que está mais ligado à rede municipal, se você não tem um instituto qualificado para tratar essa pessoa na alta complexidade. É uma sequência.”
Para que o paciente tenha um bom resultado no tratamento, é preciso ter acesso a um tratamento com qualidade desde os primeiros sintomas, porque isso vai reduzir a mortalidade, de acordo com o ex-ministro. Ao mostrar onde está o problema, o banco de dados poderá possibilitar uma solução.
“Na saúde, às vezes você tem as coisas que estão acontecendo, que são muito graves, mas que ninguém vê. Então, a ideia é mostrar o que está acontecendo, como é que o paciente caminha dentro do sistema.”
O Prisma também vai disponibilizar aos usuários um manual de uso, para que o acesso seja ainda mais simplificado. E as informações vão ser mais exatas que as disponibilizadas no DataSUS, porque passaram por uma curadoria de diversos especialistas da saúde. É o que explica a presidente do IGCC (Instituto de Governança e Controle do Câncer), Maira Caleffi.
“Temos uma melhoria na inserção da informação, porque a gente teve uma curadoria até para decidir o que importa, dezenas de dados foram excluídos e outros detalhados.”
Para André Santos, farmacêutico e bioquímico, enquanto o DataSUS tem dados mais administrativos, com gastos totais com internações e número de óbitos, por exemplo, o Prisma tem a ideia de apresentar informações clínicas de cada paciente com câncer de mama que foi tratado pela rede pública.
“O DataSUS consegue trazer ‘fotos’ de uma forma muito fácil, mas ele não consegue trazer um ‘filme’. E o que é esse filme? É conectar toda a jornada do paciente. Como o paciente começa a se tratar, qual é o tratamento, o que ele faz depois, se ele vem a óbito ou não”, explica.
A nova plataforma seguirá os mesmos padrões de privacidade do DataSUS, sem divulgar a identidade dos pacientes. Também participaram do desenvolvimento do banco de dados André Pinto, cientista de dados do Hospital de Amor de Barretos, Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia, Marco Bego, presidente do InovaHC da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Vinícius Cordovani, supervisor do faturamento de uma unidade hospitalar de alta complexidade de São Paulo e a Novartis Brasil.
Fonte: Folha de S.Paulo