Queixas contra planos de saúde quase quadruplicam em cinco anos

ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) abriu no último dia 7 consulta pública para discutir diferentes temas envolvendo planos de saúde, desde a revisão das regras para incentivar a venda de opções exclusivamente ambulatoriais, sem direito à internação, até rever critérios de reajustes dos planos individuais e familiares para permitir que operadoras façam reajustes excepcionais.

A discussão ocorre em meio a uma crise no atendimento por parte dos planos de saúde. Entre 2018 e 2023, as reclamações contra o setor saltaram 263%, de 97.336 para 353.784, segundo levantamento feito pela agência a pedido da Folha.

O caso da Notre Dame Intermédica chama ainda mais a atenção: usuários registraram quase 49 mil queixas contra a empresa junto à ANS no ano passado. As reclamações contra a operadora dispararam 778% nos últimos cinco anos –em 2018, somavam 5.578.

A Amil liderou o ranking de queixas junto à ANS nos anos de 2018, 2019 e 2020. A partir de 2021, foi a Notre Dame Intermédica quem assumiu a dianteira na lista dos planos com mais reclamações do país.

Em fevereiro de 2021,a Notre Dame Intermédica anunciou a sua fusão com a Hapvida –outra campeã de reclamações junto à ANS, ocupando o “top five” das mais reclamadas nos últimos anos.

Na Hapvida, as queixas saltaram 488% entre 2018 e 2023, para 28.067. Juntas, as empresas lideram em número de clientes de planos de saúde no Brasil, com 7,5 milhões de vidas.

Os principais problemas enfrentados pelos usuários das duas operadoras (que hoje formam um só grupo) são os mesmos: regras para acesso aos atendimentos, prazos máximos para atendimento e rede de atendimento conveniada.

Concluída em dezembro de 2023, a união entre Notre Dame Intermedica e Hapvida não foi o único movimento recente de concentração no setor. Em fevereiro de 2022, houve a compra da SulAmerica pela Rede D’Or, que também anunciou em maio deste ano a criação de uma nova rede de hospitais com a Bradesco Seguros. Já em junho deste ano foi anunciada a fusão entre Dasa e Amil para formar a segunda maior rede de hospitais do país.

Na Amil, as queixas cresceram 74% entre 2018 e 2023, para 21.411. Na operadora, os principais problemas são regras para acesso aos atendimentos, reembolso e suspensão e rescisão contratuais.

Em resposta à Folha, a Amil disse que ampliou o número de procedimentos realizados desde 2019, que no ano passado somaram 80,2 milhões. “De janeiro a agosto do ano passado houve uma média de 0,005 reclamação por cliente junto à ANS.”

Já o grupo Hapvida afirmou, em nota, que nos últimos cinco anos acrescentou mais de 2,7 milhões de vidas à sua carteira de clientes e incorporou 18 operadoras. A empresa afirma que as reclamações subiram 153% entre agosto de 2019 e agosto deste ano, “um aumento proporcional no número de demandas, acompanhando a expansão da base de beneficiários.”

O aumento das reclamações ocorre em meio à crise financeira vivida pela ANS –que está com dificuldades de pagar agências de viagem e os Correios, como apontou a Folha.

Na opinião da advogada Ana Navarrete, membro do CNS (Conselho Nacional de Saúde), a ANS já provou que tem dificuldades em impor uma regulação aos planos de saúde, tendo em vista não só o aumento das reclamações, como o avanço da judicialização.

“Existem práticas consolidadas no mercado que vão contra a regulação, como seleção de risco e exclusão de risco de vulneráveis [como o que envolve o tratamento de crianças autistas]”, diz ela. “Há um vácuo na governança da saúde suplementar e, no âmbito do CNS, se discute a criação de uma área no Ministério da Saúde que faça este ponto de conexão entre as questões envolvendo saúde pública e saúde privada.”

Como exemplo, ela cita a Secretaria de Vigilância Sanitária, responsável por formular as diretrizes da política de vigilância sanitária e acompanhar a sua execução por parte da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). “É preciso um ponto de contato junto ao Ministério, é difícil a ANS regular sozinha.”

“Um dos principais pontos de discussão recente com investidores tem sido o alto nível de judicialização do setor (com o aumento do número de ações cíveis movidas por beneficiários devido a eventos assistenciais ocorridos durante o período de carência do contrato, ou cobertura de seguro mais limitada das operadoras, por exemplo) e como isso está impactando o provisionamento e o caixa da empresa”, diz o relatório.

Para o terceiro trimestre, os analistas esperam novas saídas de caixa devido à realização de mais depósitos judiciais, resultado de contingências civis contabilizadas ou não –com valores que variam entre R$ 110 milhões e R$ 140 milhões por trimestre, até o final de 2025, afirmam.

No balanço da companhia no segundo trimestre, a própria Hapvida chamou a atenção para o assunto, quando registrou R$ 195,1 milhões em depósitos e bloqueios judiciais no período, uma alta de 80% sobre o mesmo intervalo de 2023.

Segundo apontou no balanço, o valor se refere “a causas cíveis, cujos depósitos e bloqueios são reflexos processuais da crescente judicialização no setor”, além de causas relacionadas ao ReSUS (Ressarcimento ao Sistema Único de Saúde), “cujos depósitos são necessários para que a companhia realize sua defesa judicial sem a incidência de multa moratória e encargos”. O ReSUS ocorre quando o atendimento a usuários dos planos de saúde é realizado pelo SUS.

Fonte: Folha

Planos de saúde: queixas quadruplicam em cinco anos – 29/10/2024 – Mercado – Folha (uol.com.br)

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